domingo, 26 de fevereiro de 2012

Medianeras - Gustavo Taretto

Eu suprimi um parágrafo inteiro em que eu escrevia sobre a palavra "paradoxal" constar do roteiro desse filme -- um tanto assombrosamente, aparecendo num dos voiceovers, agora não me lembro se da guria ou se do cara. Quando eu reli o que eu tinha escrito, a impressão que eu tive foi a de que eu estava cometendo exatamente o mesmo erro que eu estava querendo criticar no roteirista: o erro de fazer qualquer coisa ligada ao gênero das comédias românticas de um jeito que não se poderia imaginar Billy Crystal, sozinho pelas ruas de Manhattan na noite do Ano Novo, fazendo ou pensando. De modo que fica o registro da ideia abortada e do meu acesso de tentativa de honestidade intelectual.

De todo jeito, se ficou a sugestão vaga de que o filme é culpado por elevar demais os pensamentos dos seus personagens, numa forma que chega a ser risível para a trivialidade da situação em que eles se encontram, também um grandíssimo tributo tem que ser prestado aqui no que diz respeito à verossimilhança atroz com que um determinado pedaço da realidade é mostrado. Estou falando da perfeição com que as telas dos computadores são retratadas. Aqui eu ofereço as minhas palmas para a produção. Eu acho que eu nunca tinha visto um filme mostrando uma tela de computador tal como ela ordinariamente se apresenta na natureza. Uma coisa tão improblemática de ser feita que, até onde vai o meu conhecimento, por algum motivo vinha sendo evitada a todo custo pela indústria e pelas partes interessadas.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Der Ring des Nibelungen - Por Anna Russell

Se a versão resumida que será apresentada no Teatro Colón, na Argentina, não é resumida o suficiente para o gosto de alguém, então uma saída é assistir à versão resumida apresentada por Anna Russell.



Que pode ser lida aqui.

Dos vídeos que encontrei no youtube, esse foi o de melhor qualidade. Pela quantidade de versões, umas mais comentadas que outras, o texto foi mesmo popular em algum momento e até hoje é bastante conhecido. Bom símbolo da aversão ao intelectualismo que só os ingleses são capazes de elevar à categoria de arte, chegaram a dizer, tomei conhecimento desse monólogo por acaso. Ele veio junto num download que eu fiz dos arquivos em mp3 das quatro obras do ciclo. Escutando a coisa foi possível intuir que, mais do que só pelos bons termos do texto, a performance gestual era também bem engraçada, o que acabou me levando a assisti-la umas três ou quatro vezes, enquanto procurava as melhores imagens.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Melancholia - Lars von Trier



Eu pretendo fazer ao público o mesmo benefício que me fizeram quando me contaram mais ou menos qual é a história desse filme. O motivo que eu tenho para isso é bem simples. É que o filme é um pouco longo; e embora ele não seja o mais cheio de mistérios e intrigas que possam encher de curiosidade e apreensão a quem o esteja assistindo, para mim ele pode ser visto com mais proveito quando se sabe desde o início que, no mundo, um astro de significativa relevância se aproxima da Terra e que existe uma dúvida algo pertinente se ele pode se chocar com o planeta e extinguir a vida. Ficar com um sentimento de antecipação nervosa em relação a essa catástrofe, no meu caso, ajudou nos momentos de maior sono (também eu preciso dizer que comecei a coisa tarde da noite, um tanto cansado até). Mas, quando se passa da metade inicial, os detalhes do planeta Melancholia vão sendo apresentados com mais largueza e quase tudo que aparece na primeira parte do filme acaba sendo esquecido.

A minha inclinação, pelo menos, é esquecer detalhes que eu tenha visto em festas de casamento. E a primeira parte desse filme - estamos falando de mais de uma hora - dolorosamente se limita a uma festa de casamento, com todas os acontecimentos que os filmes sempre mostram, aliás. A lista que eu apresento é só a de alguns poucos exemplos.

Começa-se com um dos velhos truques do negócio. Um ou ambos os noivos atrasados. Na história do cinema existem algumas variações nesse recurso narrativo, mas dificilmente um casamento é mostrado sem que uma cena paralela aconteça fora da igreja ou do salão. Aqui o que temos é o atraso na limosine. O carro é tão grande que não consegue passar pela estradinha de terra entre as árvores que se desfolham. O que é uma chance para dizer, quem sabe, que o casamento dos dois é artificial; que não adianta tentarem se encaixar naquilo que as pessoas acham que seja perfeito para eles; que dá problema quando uma escolha matrimonial é tomada com base somente em estratificação social, etc. Ou uma chance, apenas, para que se ria da pusilanimidade do motorista, verdadeiramente pusilânime que ele é.

Outro evento: os discursos de brinde aos noivos impecavelmente articulados, mesmo quando breves. Não se fugiu um milímetro da regra estabelecida por nossos ancestrais de que o chefe de um dos noivos tem que aparecer e, aparecendo, falar bobagens sobre sua empresa de publicidade. Tampouco daquela sobre o pai da noiva estar bêbado e na companhia de suas amantes; e, igualmente, a da mãe, severa e fria, constrangendo as pessoas com comentários sobre a imperfeição intelectual da filha. E apenas como um adendo a isso, é claro, a irmã mais velha tem que estar mais preocupada com a organização da festa do que a própria noiva. Repassando broncas que levou da esposa, também, o cunhado se obriga aqui e ali a tentar colocar as coisas em ordem. Não estou exagerando quando digo que, no fim das contas, Jennifer Aniston de meados dos anos 2000 poderia sem qualquer problema ser a atriz principal desse filme.

Para não dizer que tudo é reprodução do manual, o arremesso do buquê foi um pouco diferente. A noiva subiu numa escada, para início de conversa, e estava de frente, não de costas, para as pretendentes. Aliás, quando o buquê vem abaixo - quem o arremessa, depois de muita hesitação da noiva, é a irmã -, o que dá para ver é que não apenas mulheres estão na expectativa de se apropriarem das flores. Até o pai da noiva está ali. Mas ok, a noiva não quer transmitir a ninguém, nem mesmo na imbecilidade de um buquê, a grande miséria materializada no ato de um ser humano de confiar em quem quer que seja. Porque, para a noiva, tudo é maldade na Terra. E se alguém duvida de como essa concepção é radical, melhor pensar de novo. Até rosbifes se degeneram para essa guria -- têm gosto de cinzas e são aviltantes à mesa.

Andei lendo por aí uma comparação da noiva com Maria Antonieta na corte francesa. Se fosse para esse casamento ser comparado com qualquer outro que não pudesse ser visto em filmes da Jennifer Aniston, insisto, o que eu faria é ir logo na óbvia comparação com Isolda - na trilha sonora do filme, salvo engano, só se tocam trechos do vorspiel de obra de Wagner. Os puristas que me perdoem, mas essa noiva lembra mesmo a heroína da lenda e personagem da ópera, e não só pelo cabelo cor de ouro. As duas, no fundo, são noivas chatas e mimadas, com uma espécie de macumbeira na família. Isolda, recebendo da mãe, se eu me lembro bem, uma poção do amor que lhe garantiria mais do que uma afinidade com o futuro marido, rei da Cornualha, a quem tinha sido prometida como esposa sem correspondentemente lhe ter qualquer afeto especial, ele tio de Tristão e infeliz que viu a mulher se apaixonar pelo sobrinho num episódio de equívoco na hora de se beber um pouco de vinho. E, de outro lado, Kirsten Dunst, com a sua irmã comprando pílulas para a morte rápida e serena para o caso de a catástrofe do planeta Melancholia se abater na placidez arquimilionária do seu castelo/sede de um campo de golfe.

Justificativa para uma segunda foto neste post:





 
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